Depois de falir uma padaria, passei um bom tempo sem me interessar por alguém. Embora, as vezes me pegasse suspirando pelo tal mocinho, caixa da padaria... Mas, com o tempo esses suspiros foram diminuindo e fui cuidar de outras coisas. Dentre elas, a minha espiritualidade.
Minha família nunca teve uma religião definida e meus pais nunca me obrigaram a seguir uma religião ou algo do gênero. De repente, seguíamos algumas convenções do catolicismo por tradição, condicionamento. Até que um dia eu senti falta de algo que preenchesse essa lacuna. Acreditava que deveria ter fé em algo, ter uma religião bem definida e praticá-la de fato. Assim, voltei a frequentar a igreja católica. Como já havia feito a catequese e primeira comunhão, procurei o curso de crisma. Durante este curso tive contato com diversos grupos de jovens que atuavam dentro da igreja de diferentes maneiras. Resolvi entrar para o grupo de canto que cuidava das missas das 19h de domingo. Adorava cantar (ainda gosto, mas hoje tenho ciência de que cantar não faz parte de minhas virtudes rs) e como já havia participado de alguns corais, essa foi a forma que encontrei de participar mais ativamente na igreja. A partir daí virei o que muitos chamam de ratinho de igreja. Muita correria para ensaiar os cantos, preparar as missas e eventos que ocorriam na igreja, como por exemplo, bingos, bailes e quermesses. E claro foi nesse universo que surgiu mais um causo.
Quando eu menos esperava, nem mais pensava em amores, paixonites; pelo contrário, até pensei em ser freira nessa época, surge um novo baterista no grupo. Um moço bonito, educado e tímido. A sua timidez era o que mais me chamava a atenção. Adorava aquele jeito acanhado... ah e como poderia esquecer, adorava sua voz grave... Quando ele fazia algumas participações nos cantos me tremia toda... Por muito tempo alimentei essa paixonite silenciosamente. Pois eu também era e ainda sou muito tímida quando se trata desses assuntos. Porém, um dia fui tomada pela coragem e resolvi que iria me declarar. Não sabia como, mas iria. Como sempre me dei melhor com as palavras escritas do que com as faladas resolvi escrever uma cartinha. Talvez as revistas que eu lia na época tenham me influenciado também. Pois, embora “religiosa”, tinha também meus caprichos de menina e lia minhas revistinhas femininas. Cada bobagem rs. E ainda sobraram alguns vestígios dessas leituras, como por exemplo, me pegar lendo páginas sobre comportamento, dietas e horóscopo...
Voltando a carta. Após decidir que a escreveria e como a escreveria, fui correndo a papelaria comprar o papel de carta mais charmoso, o envelope mais bonito, a canetinha com mais gliter e enfim me declarar e acabar com essa agonia, liberar esse amor... E no dia seguinte lá estava eu em frente a sua casa, tomando todo cuidado para não ser vista, colocando a carta em sua caixa de correio.
Chegou o final de semana, mais um encontro do grupo e eu ansiosa para saber qual seria a reação. Para a minha tristeza nada acontece. Passaram semanas, meses e nada aconteceu... E eu nunca tive coragem de perguntar a ele sobre a carta. Prosseguimos agindo como se nada tivesse acontecido. Com o tempo, a frustração fui perdendo o interesse... Surgiram novos questionamentos, novas ideologias, novas formas de encarar a vida, a espiritualidade e como consequência a igreja não me bastava e me afastei dela. Com isso perdi contato com essas pessoas e até hoje não sei se o moço tímido, de voz grave leu minha cartinha apaixonada...